Com a vinda de Serpente e seus "deuses" do Medo à Terra, não é surpresa ver caos e insanidade dominando as pessoas. Mas quem disse que as entidades asgardianas são as únicas ameaças por aí? Como a Fabulosa X-Force descobre durante sua missão, não falta gente aproveitando para causar ainda mais mortes e destruição. E talvez os heróis sejam os próprios culpados por tudo isto.
Antes de comentar a história, uma observação: ela não faz parte da série mensal da Fabulosa X-Force; trata-se de uma minissérie em três edições, publicada na íntegra aqui no Brasil em A Essência do Medo Especial 1. Mesmo a equipe criativa não é a mesma aqui, com Rob Williams (não confundir com o comediante estadunidense ou com o cantor britânico) nos roteiros e Simone Bianchi na arte. Desta forma, o que vemos aqui é uma missão à parte da X-Force, que não sofre consequências do que já aconteceu na série mensal de Rick Remender e nem traz consequências para essa mesma série.
Tudo começa quando Purificadores começam a atacar civis, além de sequestrar e executar super-humanos (bom, pelo menos um super-adolescente). O modus operandi em questão não combina com o estilo tradicional dos fanáticos, que normalmente só matam mutantes; ocorre que parte dos Purificadores considera que a vinda das entidades asgardianas possuindo super-seres da Terra é um sinal de que o inferno está se abrindo na Terra, e que a única forma de salvar suas almas é morrer antes da chegada do diabo e levar consigo o maior número de almas - que estariam sendo "salvas" do demônio. Se as pessoas mortas nesses atentados queriam ser "salvas"? Isso não tem importância para eles.
A X-Force obviamente vê um problema nisso e parte para deter os vilões. Porém, durante a missão, eles descobrem que os Purificadores consideram que foram os mutantes e demais super-seres que trouxeram o inferno para a Terra. E aí, entra o dilema moral da história: será que os Purificadores estão completamente errados nessa questão? Mesmo dentro da equipe há divergências. Deadpool (numa surpreendente engraçada entrevista para bichinhos de pelúcia) comenta sobre como a sujeira com que a X-Force lida assusta até mesmo a ele, enquanto Psylocke questiona se deuses asgardianos estariam preocupados em virem à Terra se o Thor não tivesse entrado para os Vingadores, ou se a própria existência dos super vilões não seria consequência da existência dos super-heróis. Mesmo Fantomex, que normalmente não parece se preocupar com como é visto, fica incomodado ao ver as pessoas que acabou de salvar com medo dele. E não as culpa por isso: afinal, qual a diferença entre a X-Force e os assassinos que eles matam?
Mas essa é uma reflexão que a X-Force não pode fazer agora, pois o neurocirurgião Jonathan Standish - líder da divisão citada dos Purificadores - pretende tomar (ou melhor, "salvar") todas as vidas que puder. Inicialmente, conclama as pessoas no mundo todo a cometerem suicídio para evitarem que o demônio se aposse de suas almas - mas "apenas" algumas milhares sucumbem ao medo e o obedecem. Assim, se as pessoas não querem salvar suas almas, o jeito é salvá-las à força. Ou pelo menos assim pensa Standish, enviando Purificadores ciberneticamente aprimorados para abrirem fogo em várias partes do mundo. E com bombas-relógio equipadas a seus corpos...
Acham pouco? Standish acha. Sua cartada final é explodir uma bomba que emite um pulso eletromagnético capaz de "desligar" os cérebros de qualquer pessoa num raio de quarenta quilômetros quadrados sobre Nova York. Wolverine estima que, se ele tiver sucesso, o número de mortos chegaria aos milhões. E aqui, na batalha final contra Standish, a equipe mostra a contradição em que vive: arriscando suas próprias vidas, eles são capazes de deter o avião dos Purificadores e impedir a detonação da bomba. Neste dia, os cinco anti-heróis famosos por tirar vidas salvam vidas, não poucas, mas milhões de vidas.
O que não impede Wolverine de decapitar o fanático religioso bem em frente a uma igreja...
No fim das contas, o ponto alto do envolvimento da X-Force em A Essência do Medo é a discussão sobre os danos que os heróis muitas vezes causam à sociedade e à ética de muitos deles - até que ponto um herói pode tomar atitudes questionáveis e ainda ser considerado um herói, e a partir de que momento ele pode ser considerado um vilão? É uma pena que esta reflexão não é explorada como poderia, muitos argumentos soando relativamente vazios. O jeito é continuarmos nós o debate, e aproveitar esta história pelos seus momentos de ação e pelas cenas surpreendentemente divertidas com o Deadpool.
Fernando Saker
Antes de comentar a história, uma observação: ela não faz parte da série mensal da Fabulosa X-Force; trata-se de uma minissérie em três edições, publicada na íntegra aqui no Brasil em A Essência do Medo Especial 1. Mesmo a equipe criativa não é a mesma aqui, com Rob Williams (não confundir com o comediante estadunidense ou com o cantor britânico) nos roteiros e Simone Bianchi na arte. Desta forma, o que vemos aqui é uma missão à parte da X-Force, que não sofre consequências do que já aconteceu na série mensal de Rick Remender e nem traz consequências para essa mesma série.
Tudo começa quando Purificadores começam a atacar civis, além de sequestrar e executar super-humanos (bom, pelo menos um super-adolescente). O modus operandi em questão não combina com o estilo tradicional dos fanáticos, que normalmente só matam mutantes; ocorre que parte dos Purificadores considera que a vinda das entidades asgardianas possuindo super-seres da Terra é um sinal de que o inferno está se abrindo na Terra, e que a única forma de salvar suas almas é morrer antes da chegada do diabo e levar consigo o maior número de almas - que estariam sendo "salvas" do demônio. Se as pessoas mortas nesses atentados queriam ser "salvas"? Isso não tem importância para eles.
A X-Force obviamente vê um problema nisso e parte para deter os vilões. Porém, durante a missão, eles descobrem que os Purificadores consideram que foram os mutantes e demais super-seres que trouxeram o inferno para a Terra. E aí, entra o dilema moral da história: será que os Purificadores estão completamente errados nessa questão? Mesmo dentro da equipe há divergências. Deadpool (numa surpreendente engraçada entrevista para bichinhos de pelúcia) comenta sobre como a sujeira com que a X-Force lida assusta até mesmo a ele, enquanto Psylocke questiona se deuses asgardianos estariam preocupados em virem à Terra se o Thor não tivesse entrado para os Vingadores, ou se a própria existência dos super vilões não seria consequência da existência dos super-heróis. Mesmo Fantomex, que normalmente não parece se preocupar com como é visto, fica incomodado ao ver as pessoas que acabou de salvar com medo dele. E não as culpa por isso: afinal, qual a diferença entre a X-Force e os assassinos que eles matam?
Mas essa é uma reflexão que a X-Force não pode fazer agora, pois o neurocirurgião Jonathan Standish - líder da divisão citada dos Purificadores - pretende tomar (ou melhor, "salvar") todas as vidas que puder. Inicialmente, conclama as pessoas no mundo todo a cometerem suicídio para evitarem que o demônio se aposse de suas almas - mas "apenas" algumas milhares sucumbem ao medo e o obedecem. Assim, se as pessoas não querem salvar suas almas, o jeito é salvá-las à força. Ou pelo menos assim pensa Standish, enviando Purificadores ciberneticamente aprimorados para abrirem fogo em várias partes do mundo. E com bombas-relógio equipadas a seus corpos...
Acham pouco? Standish acha. Sua cartada final é explodir uma bomba que emite um pulso eletromagnético capaz de "desligar" os cérebros de qualquer pessoa num raio de quarenta quilômetros quadrados sobre Nova York. Wolverine estima que, se ele tiver sucesso, o número de mortos chegaria aos milhões. E aqui, na batalha final contra Standish, a equipe mostra a contradição em que vive: arriscando suas próprias vidas, eles são capazes de deter o avião dos Purificadores e impedir a detonação da bomba. Neste dia, os cinco anti-heróis famosos por tirar vidas salvam vidas, não poucas, mas milhões de vidas.
O que não impede Wolverine de decapitar o fanático religioso bem em frente a uma igreja...
No fim das contas, o ponto alto do envolvimento da X-Force em A Essência do Medo é a discussão sobre os danos que os heróis muitas vezes causam à sociedade e à ética de muitos deles - até que ponto um herói pode tomar atitudes questionáveis e ainda ser considerado um herói, e a partir de que momento ele pode ser considerado um vilão? É uma pena que esta reflexão não é explorada como poderia, muitos argumentos soando relativamente vazios. O jeito é continuarmos nós o debate, e aproveitar esta história pelos seus momentos de ação e pelas cenas surpreendentemente divertidas com o Deadpool.
Fernando Saker