segunda-feira, 6 de abril de 2009

Thor: Deuses e Filhos

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Asgard está estabelecida depois que o martelo Mjolnir, sempre em posse do soberano monarca Thor, iluminou os céus e trouxe de volta quase todos os habitantes do divino reino, devolvendo os asgardianos aprisionados em corpos humanos às suas verdadeiras formas. É nesse clima de suposta calmaria que J.M. Straczynski escreveu duas de suas melhores histórias com o Deus do Trovão nas páginas de Novos Vingadores, porque nem mesmo no mundo dos sonhos os justos encontram a paz...

Todos olham boquiabertos quando o poderoso Thor entra no salão carregado por Balder e Hogun. O rei pede para ser levado aos seus aposentos, não querendo ser visto assim tão fraco. Loki tem uma expressão sinistra no rosto quando vê o irmão passar indefeso diante dela. De fato, Thor está sobrecarregado após realizar o feito que poderia ter custado sua vida e somente o Sono de Odin pode restaurar suas forças, assim como fazia com seu pai.

Todavia, ele aprendeu com os erros de outrora e não quer ficar vulnerável durante o descanso, portanto tinha mandado chamar o ferreiro de Odin e lá estava Falki quando os três entraram no quarto. O ferreiro forjara uma espécie de tumba impenetrável imbuída de feitiços que reproduzem um estado entre a vida e morte, e tal qual um coma induzido por médicos mortais, permite que os gravemente feridos se recuperem mais rapidamente.

Thor encarrega o iluminado Balder de tomar conta de Asgard enquanto ele se recupera, então adentra na escuridão do caixão, desejando melhores decisões para o amigo. Balder fecha a tumba e para sua grande surpresa acaba inadvertidamente causando o surgimento de Donald Blake. O bom doutor explica calmamente que tem sua vida de volta enquanto Thor estiver repousando e parte apressado para algum compromisso.

Vagando no limbo, Thor é atormentado pelos corvos de Odin: as aves indagam sobre as verdadeiras razões que impedem o “principezinho” de pelo menos tentar trazer o antigo rei de volta. A resposta é que ele só pode recuperar aqueles que morreram durante o Ragnarok, não antes dele como é o caso de Odin, mas os corvos acham que isso não passa de uma desculpa para manter Odin longe do trono.

Thor reafirma que nada poderia fazer e segue seu caminho, atraído pelo som familiar de batalha que vem além das colinas longínquas. Entrementes, Blake compra uma passagem para Nova York no aeroporto, à procura de Jane Foster, um antigo interesse romântico dele e de Thor.

Do outro lado das colinas ocorre uma fantástica batalha entre Odin e Surtur, como se os tentáculos da morte não tivessem atingido nenhum dos dois. O Deus do Trovão hesita no primeiro momento, mas parte para o auxílio do pai quando a maré da batalha se volta contra o mesmo. Todavia, antes da chegada de Thor, Odin desfere um golpe fatal no inimigo e ele arde em chamas até desaparecer na fumaça da própria carne.

Confuso, Thor socorre Odin, preocupado com os ferimentos do pai. Odin, por sua vez, conta que naquele lugar ele estará curado pela manhã, então questiona o que seu herdeiro faz na terra dos não vivos. Thor explica que se trata do Sono de Odin e o próprio Odin admite que agora é o Sono de Thor, uma vez que o poder e o trono pertencem a ele.

Odin refuta quando o filho se oferece para restaurá-lo assim como fez aos outros, dizendo que ele já teria feito algum esforço nesse sentido se realmente desejasse tê-lo de volta, embora saiba disso porque em seu lugar também nada faria. Afinal, se existe uma coisa que deuses e mortais partilham em comum, é que os filhos precisam matar os pais para se tornarem donos dos próprios destinos.

Os dois iniciam uma longa caminhada enquanto Odin conta um pouco de sua origem, começando por seu pai, Bor, e como ele tinha lhe ensinado tudo que precisava saber para defender os sonhos dele. Todavia, nada dizia sobre como ter um sonho em primeiro lugar, por isso Odin deu vida ao homem na estéril Midgard para criar algo seu. Bor ficou muito incomodado com isso, passando a causar todo tipo de mal e tormento aos indefesos mortais, já que não podia desfazer a criação do filho.

Então veio outra guerra contra os gigantes do gelo e os corajosos asgardianos não fugiram dela, afinal, não eram liderados por Bor? A batalha já estava vencida quando o rei decidiu perseguir um inimigo em fuga e acabou caindo na armadilha de um poderoso mago encapuzado. Seu corpo fora transformado em neve viva e a cada lufada do vento ele era mais despedaçado, até desaparecer por completo diante de um imóvel Odin.

O pedido de Bor antes do vento levar sua voz era simples: “Encontre um feiticeiro, o mais poderoso que puder. Meu espírito jaz na neve, espere meu chamado. Ajude-me, filho...”

Mas naquele dia Odin nada fez além de anunciar a morte de Bor, se tornando ele o rei, um homem livre para fazer seu destino e transformar Midgard no que bem quisesse. Mas a cada inverno Odin podia ouvir a voz do pai chamando de onde seu espírito fora aprisionado, até que um dia decidiu não lhe dar mais ouvidos e a voz cessou. A vingança de Bor só viria mais tarde na forma de uma criança com os olhos azuis iguais aos dele.

O nascimento de Thor pareceu despertar novamente o espírito de Bor e certa noite ele e Odin tiveram uma audiência nos corredores do castelo. Ele vinha com uma oferta de contrição, anunciando que Odin seria deixado em paz se adotasse o filho de outro pai morto por suas mãos. Ainda assim, o fantasma anunciou que o destino de Odin seria a solidão, porque a traição estava em seu sangue.

Os gigantes de gelo não demoraram a atacar de novo e mais de sua espécie foram mortos. É claro que alguns deles tinham filhos, e um especialmente frágil atacou o assassino do pai em busca de vingança, sendo facilmente detido pelos guardas do rei. Odin sentiu que era aquele menino vingativo que deveria cuidar e amar como seu. E apesar de muitas histórias narrarem versões diferentes daquele dia, algumas delas espalhadas pelo próprio Odin, essa era a verdadeira origem de Loki.

Mas Loki não era nenhum perdão da parte de Bor, ele fora colocado sob seus cuidados para se tornar um instrumento da vingança, uma serpente que dali em diante estaria sempre pronta para dar o bote nos asgardianos. Assim termina a história de Odin e a caminhada com Thor. Decepcionado, ele diz a Thor que não sabia que seu pai podia ser tão maligno, embora devesse saber, já que tinha essa mesma escuridão dentro dele.

Odin declara que não fora chamado de volta porque estava amaldiçoado a ser abandonado como Bor, um destino que talvez merecesse para poder expiar seus pecados. Talvez também houvesse um propósito maior para sua permanência ali. Ele ignora as negações de Thor, aproveitando que se recuperou dos ferimentos para partir de encontro ao inimigo que espreita, convidando o filho ir junto. Surtur está esperando.

Em Nova York, Blake encontra a doutora Foster atendendo uma senhora idosa muito doente no centro de oncologia do hospital onde ela trabalha. O lugar é muito agitado, mas eles conseguem arranjar um tempo para conversar e Jane confessa que se divorciou do marido quando soube que Donald estava vivo. Sentindo-se culpado pelo divórcio, Blake explica que veio a Nova York atrás de Sif, esperando que Jane soubesse de algo a respeito por causa da conexão que certa vez as duas tiveram.

Mas a moça está furiosa ao descobrir que na verdade Blake procurava por outra mulher e chega a lhe dar um tapa no rosto. Ele admite o erro, dizendo que pretendia amaciar a notícia para Thor caso ela fosse ruim, depois justifica sua falta de cortesia pelo fato de ser a primeira vez que está sozinho em muito tempo. Por um momento a doutora Foster abandona a sala e a conversa é interrompida.

No limbo, a batalha contra Surtur está cada vez mais próxima e pai e filho caminham lado a lado em sua direção. Odin explica que o inimigo também se recupera dos ferimentos no amanhecer, lutando diariamente em busca de libertação, somente para perecer nas mãos dele num eterno ciclo de luta, sangue, morte e ressurreição. Sabendo da sina do pai, Thor se oferece mais uma vez para libertá-lo, mas Odin sabe que no fundo não é esse o desejo do filho.

Não, porque Odin sabe que é seu destino permanecer naquele lugar terrível e impedir o demônio de trazer caos o mundo, Odin sabe que é seu destino garantir que o povo de Asgard aproveite o que Thor lhes deu, nada mais do que a libertação do ciclo de morte que ele mesmo foi incapaz de quebrar, logo nada é mais justo do que permanecer ali e defender a criação do filho. Surtur espera diante deles.

Pai e filho se posicionam lado a lado uma vez mais, quebrando a maldição de Bor, porque Odin não está sozinho. Thor se juntou a ele na batalha contra Surtur, desfazendo a profecia de seu abandono no momento que se ofereceu para restaurá-lo. Pai e filho partem para cima do monstro e em uníssono eles gritam “Por Asgard!”

E o filho promete que o pai não morrerá nesse dia.

Por outro breve momento voltamos a Donald Blake e Jane Foster. O doutor espera a amiga sair do banheiro, ouvindo as lamurias da mesma paciente que ela atendia antes. A senhora pede a ajuda de Blake, mas Jane sai do toalete antes que ele possa fazer alguma coisa, passando o serviço para uma enfermeira. Por fim, ela responde que não sente a presença de Sif nela e saberia dizer caso sentisse tamanha era a ligação entre as duas.

Blake lamenta ter que dar essa notícia a Thor, mas nada pode fazer. Eles se despedem amigavelmente, com a promessa de saírem para jantar da próxima vez, mas nenhum dos dois consegue ouvir a voz de Sif nos pedidos de socorro da confusa anciã em estado terminal. Aparentemente, Loki mantém o espírito da deusa em seu hospedeiro humano, assumindo a forma de enfermeira para tanto.

A batalha no limbo está terminada e Surtur foge para lamber as feridas e lutar outro dia, pois não foi páreo para o poder conjunto de pai e filho. O demônio voltará no amanhecer, como sempre faz, mas Odin declara que o importante é que nesse dia eles venceram. Thor discorda. O Deus do Trovão diz que o importante é que pai e filho se reuniram nesse dia e haverá um dia que eles se reunirão outra vez.

Odin percebe que o descanso de Thor está terminando e pede para o filho não lembrar dele com tristeza, afinal, existe algo mais próximo de um paraíso nórdico do que viver e morrer eternamente numa batalha sem fim? Odin deseja uma boa vida a Thor enquanto ele faz o caminho de volta para o mundo dos vivos.

Na saída, os corvos zombam dele mais uma vez, mas concordam que talvez o principezinho tenha encontrado o perdão que buscava por ter deixado o pai num lugar como aquele. Ele pergunta de quem tinha recebido esse perdão. “De você mesmo, é claro”, responde uma das criaturas.

Enfim, Thor desperta e abre a tumba, fazendo Donald Blake desaparecer nas ruas de Nova York. A história termina com Thor declarando aos asgardianos que os deuses que podiam ser resgatados já o foram e agora era a hora de construir um futuro próspero para Asgard. Assim, Thor cumpre seu destino e o pedido de Odin. Enquanto isso, Sif aguarda seu amado no leito de morte.

Pessoalmente, achei o arco intitulado “Questões Paternas”, publicado nas edições 61 e 62 de Novos Vingadores, a melhor contribuição de J.M. Straczynski nas histórias do Thor até agora, e Marko Djurdjevic não deixou nada a dever a Olivier Coipel, mostrando que seu talento vai bem além das capas. É uma história sem muita ação, mas recheada de um lirismo raro em revistas convencionais de super-heróis. Espero que se divirtam lendo tanto quanto eu me diverti escrevendo esse review.

Brizola

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